domingo, 27 de dezembro de 2009

O valor de uma boa definição

É difícil para pessoas racionalistas ao extremo, como nós matemáticos por exemplo, aceitar qualquer conceito que não esteja suficientemente bem definido.

É justamente de inconsistências conceituais que parte a maioria dos questionamentos que fazemos, assim como sua posterior verificação.

Se for dada a um matemático a sequência:
0, 1, 1, 2, 3, 5, 8 e 13
e lhe for perguntado qual deveria ser o próximo número da sequência, ele provavelmente lhe diria supor ser o número 21, mas também lhe diria que não é possível afirmar com certeza, uma vez que não fora informado qual o método usado para gerar tal sequência.

Quando um ateu questiona a existência de divindades, ele normalmente toma como base as definições populares dadas às divindades que questiona, ou então toma como referência o conceito genérico de divindade.

Algumas divindades são bem definidas, ainda que apresentarem inconsistências lógicas facilmente observáveis.

Hércules por exemplo, era tido como um semi-deus, meio humano e meio deus, no entanto era uma divindade razoavelmente bem definida.

O deus cristão, normalmente denominado apenas Deus, não teve a mesma sorte. Nenhuma boa e completa definição de Deus nos foi dada. As melhores que já obtive foram sempre fragmentadas, e a maior evidência disso é o fato de nem mesmo os cristãos chegarem a um consenso quanto a ela.

Obviamente, como ex-cristão e ateu, tenho minha definição de Deus, formada com base justamente nos inúmeros fragmentos que fui colhendo durante o tempo em que me dediquei a cultuar tal ser.

Esta é a definição que tenho hoje de Deus:
Personagem principal da mitologia cristã. A ele são atribuídos os poderes de onipresença, onisciência e onipotência, uma existência perpétua para antes e depois da criação do Universo, a própria criação do Universo e obviamente tudo que o compõe, a propriedade sobre as vidas e almas humanas, assim como tudo mais que possa existir e o direito de realizar num futuro incerto o julgamento das almas humanas, com base em suas atitudes e sua servidão a ele enquanto em vida. Também são considerados fidedignos os relatos bíblicos a seu respeito, sendo os quatro evangelhos de Jesus Cristo os principais.

Acredito que a maioria dos cristãos endossariam facilmente tal definição, embora provavelmente acrescentassem alguns detalhes e removessem a parte que refere a ele como um ser mitológico. Até porque todo o restante da definição foi formado enquanto eu ainda era cristão*.

Para um racionalista, não é difícil enxergar inconsistências lógicas em tal definição. Principalmente se considerados os inúmeros relatos bíblicos que são tidos como fidedignos pelos cristãos.

Caso o racionalista que esteja a observar tais inconsistências seja um cristão, ele terá que optar por ignorá-las pura e simplesmente, questioná-las a fundo e terminar no mínimo deixando de ser cristão, ainda que não se torne ateu, ou tentar justificá-las desesperadamente em defesa de seu deus.

Isso aconteceu comigo, ao longo de alguns anos, na verdade ao longo de toda a minha vida, até que finalmente me vi completamente ateu.

Embora sejam muitas as características de tal definição que pareçam inconsistentes, ou ao menos vagas, por se tratar de uma definição, basta que uma única inconsistência seja encontrada para que ela deixe de ser uma definição válida. É assim para qualquer análise lógica, a respeito de qualquer definição. Veja por exemplo o Paradoxo de Russell.

Aos poucos fui percebendo as inconsistências na definição que eu tinha de Deus, e que aparentemente era compartilhada pela sociedade na qual eu vivia. A cada inconsistência encontrada, eu alterava tal definição de modo a torná-la consistente. Removia características que eu considerava ilógicas. Até que em um dado momento percebi que eu não poderia mais me considerar cristão, uma vez que o deus no qual eu cria não era mais o deus cristão. Após algum tempo percebi que tal deus de fato não existia mais, ou se existia não era mais capaz de interceder por nós. As evidências me convenciam mais e mais disso a cada dia, até que me vi não mais teísta, mas apenas deísta.

Com uma definição de Deus tão pessoal e cada vez mais reduzida, em um dado momento ela simplesmente se foi por completo. A partir de tal momento eu adotei novamente a definição original e acrescentei o caráter mitológico a ela.

Provar a inexistência de um criador universal é bem diferente de provar a inexistência de uma divindade em particular. E para provar a inexistência de uma divindade em particular, basta encontrarmos e demonstrarmos formalmente uma única inconsistência que seja em sua definição.

Após isso a existência de tal divindade ainda seria possível, mas sua definição não poderia mais ser a mesma. Ela teria de perder um pouco de si para se manter crível. E dificilmente sobreviveria a mais algumas análises.

Infelizmente isso também se aplica ao Deus cristão. E podemos demonstrar que, tal como definido pela própria mitologia cristã, tal divindade não se mostra crível o suficiente para ser considerada mais que um mero mito. Ao lado de Hercules, Zeus, Shiva, Iemanjá, Odin e tantos outros.

* Caso algum cristão queira apresentar uma definição melhor, agradeço de antemão.

4 comentários:

  1. Tenho pena do Sr. respeito sua opinião esse é um direito seu, claro. Mas fico triste em saber que existe pessoas que realmente pensam assim, olha sincesaramente, não encontro nexo, lógica no seu conteúdo, o Deus mito, impressionante, o sr. tirou isso da onde? só pq nunca viu? ou porque quando o sr. era criança o sr. pediu alguma coisa a Ele, e o mesmo não lhe retribuiu? - Bom mas é a sua opinião né. Respeito. Mas não acreditar em Deus não sei como o sr. está bem, não ficou louco ainda. Quem mais poderia criar o sol, uma grande esphera de fogo, quem poderia ter criado os animais, a vegetação, a água? - vem me dizer que vc acredita nisso que ouve uma grande exploção e um grão de areia foi se desenvolvendo, que dele veio o universo, os planetas, que uma larva virou um jacaré, e o homem veio do macaco? se veio do macaco, pq macaco hj não vira homem? vem me dizer que isso mudou na genética, e macaco não vira mais homem. Acho que está acontecendo ao contrário, o homen está virando macaco, pq chegar ao ponto de não acreditar em Deus. Algum ser superior que nós, tem que está sustentando isso.
    Bem, viva e seja feliz..

    Que Deus te abençoe..

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  2. Primeiramente Felipe, seja bem vindo.

    Você fez muitas perguntas, e não sei se está mesmo interessado nas respostas. Se estiver, lhe recomendo começar lendo os outros posts deste blog, ondem já vai encontrar a resposta para muitas delas, em especial neste aqui.

    Não tome como ofensa o que vou dizer, mas pelas suas perguntas posso perceber que você ainda é muitíssimo imaturo intelectualmente para poder entender as razões que levam uma pessoa a deixar a crença herdada dos pais e se tornar ateu. Mas se você quiser, lhe explico com prazer.

    Se quiser que eu responda mesmo a suas perguntas, é só dizer que responderei a cada uma delas.

    []'s

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  3. Teno pena (não no sentido mal da palavra) de voce também deve ser bem dificil enfrentar a vida sem nehum tipo de esperança de que existe algo a mais, de qualquer forma pelo o que vi no seu blog voce não é ateu necessariamente e sim anticristianismo, trata-se da sua vontade de fazer com que a ciencia especifique que realmente Deus existe, na realidade Deus nos deu inteligencia para criar a ciencia para nos ajudar, a ciencia não vai nos dizer que Deus realmente existe depois do iluminismo tudo deve ser empirico, deve ser testado para se tornar realidade, mas a ciencia vai te confortar com a morte de um parente ou tristeza que te ocorrem? Ok, ok; vamos pensar pelo lado racionalista, é algo naturalm (diga-se criado pela natureza) sera que somos tão robóticas para pensarmos de forma tão seca, tendo em mente que o nos difere dos animais é isto, sentimentos. E uma outra coisa, sera que realmente iriamos nos desenvolver (leia-se da forma Darwiniana, mesmo) nos interligando com animais, terra, estações do ano, ritmo circadiano e etc, para nada sendo que o ser humano é o centro de tudo? Sei lá, ja conversei com varios ateus mas nenhum deles me provou ser ateu e sim desiludido com algo, todos falam da mesma forma, são extremamente furiosos ao falar desse devaneio chamado *Deus*, Deus existe independentemente da sua vontade ou crença, e se ele realemnte foi criado por nós seres humanos para nos confortarmos ou sentirmo-nos melhor, tem algo de errado nisso?

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  4. Engano seu Alan, não sou anticristianismo. Sou cético e ateu apenas.
    E não espero que a ciência prove que Deus existe ou não. Já me convenci que isso não é verdade.

    De fato é uma dura realidade a que encaramos quando abandonamos a muleta espiritual que a religiosidade nos proporciona, mas não é porque a realidade é cruel que eu vou preferir viver embreagado.

    Sobre ateus revoltados, há sim desses, mas também há aqueles que são ateus por conviccão, e não por revolta. Eu me incluo nesse segundo grupo. Veja este post.

    Sobre escolhermos crer em Deus para nos confortar, ainda que ele possa não existir, não vejo isso como algo ruim. De fato há um lado bom nisso, e que ajuda a muitas pessoas, Deus existindo ou não. Mas há algo de ruim sim nos exageros, desrespeitos e absurdos que são cometidos em nome de qualquer deus.

    Eu fui capaz de enxergar que deuses não passam de mitos, e uma vez feito isso, eu teria que ser, literalmente, ignorante, e falso, para continuar crendo nele. Se você não é capaz de ver isso, e se sente bem sendo confortado pela possibilidade/certeza de poder contar com Deus, seja feliz assim.

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